20/03/2020

"A PEDAGOGIA CRÍTICA DE PAULO FREIRE DEU ERRADO!" ou de quando um erro não justifica o outro... ou ainda "minha orientadora me perdoara por gastar algum tempo nisto"

1. Sou inscrito (não, não assinante) do canal do Brasil Paralelo. Tenho assistido os teasers e trailers relativos ao próximo documentário "bombástico" do grupo: "Pátria Educadora". Documentário que aborda aquilo que consideram os problemas da educação brasileira. Em todos vídeos é consenso entre os especialistas que o grande problema da educação brasileira foi e é o de método (de um método que se desdobra no próprio método e em conteúdos que a ele são afeitos). Este, como aponta de Olavo de Carvalho, seria o método da pedagogia crítica freiriana. Paulo Freire e sua adoção como patrono e exemplo para a educação brasileira seriam os principais responsáveis pelo fracasso e atraso desta mesma educação;

2. Podemos observar que este é o mesmo discurso (discurso padrão inclusive) de nosso presidente, seu governo e sua equipe. Bolsonaro em pessoa, seus filhos , os seguidos ministros do MEC, seus aliados e apoiadores, elegeram o inimigo a atacar na frente educacional e cultural: o "freirianismo". Não à toa a escolha, pelo Brasil Paralelo, do tema de seu próximo documentário e de sua narrativa. É a hora da Cruzada contra os (reais) inimigos de educação! "Malditos freirianos que fazem com que nossas crianças e jovens não aprendam nada!" Uma narrativa com um objetivo: desconstruir Freire e aqueles que, de alguma forma, se apoiam em seu legado na busca de construir uma educação pública de qualidade em nosso país. Fato que, como dito, nesta narrativa Paralelo-Olaviana, seria o responsável por nossos problemas e atrasos na educação nacional;

3. Não entrarei na celeuma de que Freire não era um marxista ou comunista como a direita liberal e/ou "conservadora" o acusa (Freire é um fenomenólogo permeado por todo um existencialismo idealista) posto que não está entre os objetivos deste "breve" texto provar que cavalo não é boi;

4. Os que surfam na maré da onda ultra liberal "conservadora" em ascensão ao mesmo tempo que atacam o freirianismo fazem questão de destacar como a educação militar dá certo e possui ótima qualidade, principalmente nos colégios militares das Forças Armadas. De como os colégios militares e/ou militarizados obtém boas notas nos testes nacionais e internacionais. Que estes, se isolados (se lavadas em conta apenas suas notas) estariam na parte de cima do ranking educacional mundial, e normalmente no Top 15;

5. Estão completamente certos e deve-se dar toda razão aos nossos compatriotas "amantes dos colégios militares e/ou militarizados". Eu, especifica e particularmente, não tenho nada contra eles e tenho total acordo com os projetos do governo que visam tanto aumentar o número de colégios  e escolas militares, quanto militarizar alguns que são eternos problemas de disciplina e criminalidade violenta. Não comungo dos valores desta "esquerda" (hoje bem definida por alguns como a esquerda do lacre...poderia ser definida também como a esquerda da bolha, tão contrária ao legado freiriano de sujar o pé no chão sujo de barro) que prefere traficantes dominando uma escola do que meia dúzia de militares em tarefas de gestão administrativa e de manutenção de disciplina e ordem;

6. Mas voltemos a educação crítica Freiriana, supostamente adotada hegemonicamente em nossos sistemas de ensino, nos variados níveis e esferas. A crítica a educação do oprimido, a educação libertadora, a educação Freiriana seria justa? Comecemos com a primeira pergunta: hoje, onde a educação freiriana foi mais longe, em que sistema ela é adotada de maneira mais completa? 
Ao analisarmos leis, estatutos, regimentos, projetos políticos pedagógicos, toda uma série de outros documentos legais e institucionais, e - o que é mais importante - seu funcionamento, chegamos a resposta da primeira pergunta: na Rede de Institutos Federais;

7. Façamos então uma segunda pergunta: qual a qualidade da educação prestada nos Institutos Federais? Ora, se o critério para avaliar qualidade dos IFs for o mesmo do usado para os Colégios Militares, qual seja, o desempenho nos testes nacionais e internacionais (em especial o PISA), temos que os IFs são de qualidade igual (superior) tal qual os CMs. Que as duas redes de instituições estão entre o Top 15 da educação nos países. Vejamos as notas dos Institutos Federais no PISA. 
Gráfico elaborado pelo The Intercept Brasil
8. Assim chegamos a grande contradição deste governo (do qual, claro, não se espera o mínimo de inteligência, coerência, e menos ainda de interesse nacional): se os Colégios Militares são apresentados como exemplo e modelo (e sim o são, independentemente do que certa "esquerda" ache) os Institutos Federais também o são. No mínimo no mesmo nível. Se os Colégios Militares são devida e justamente louvados e apoiados por este governo, por que os Institutos Federais e a maioria de seus servidores são atacados? Os dois deveriam ser exemplos, modelos e focos de irradiação de conhecimentos para as demais redes. Deveriam ao mesmo tempo ter a obrigação disto, e serem apoiados para tal tarefa pelo governo federal;

9. Neste momento não trato: a) da questão dos custos por aluno e do debate sobre a questão estrutural nas instituições de ensino, e do impacto disto na qualidade do ensino. É óbvio que Estados e municípios não podem atingir o mesmo nível de investimento da esfera federal, mas são possíveis e necessários avanços; b) de como, nos Institutos Federais, o freirianismo (a educação crítica) se comunga com uma educação técnica, tecnológica, profissionalizante e científica extremamente rigorosa e exigente, prova de que nem Paulo Freire, nem a correta compreensão e aplicação de seu "método" e ideias, têm algo que ver com as acusações chulas da direita "conservadora" de que há uma defesa do rebaixamento das exigências e níveis de ensino com facilitação de avaliações e aprovações para obter uma formação aligeirada (não obstante alguns "freirianos" se esforcem muito para dar veracidade a essa caricatura da direita). Só alguns "freirianos" neoliberais (que querem formão mão de obra rapidamente para o mercado) e imbecis acríticos ditos "conservadores" podem considerar que estas duas coisas são excludentes: educação rigorosa (e exigente) e educação crítica. O pequeno erro de alguns (falsos) freirianos de serem, de fato, defensores do rebaixamento dos níveis educacionais para aligeiramento da formação (os chamo de "freirianos" a serviço do neoliberalismo) não torna mais verdadeiro o quadro geral pintado pela direita liberal e seu delírio anti-Freire. O pequeno erro de um setor da esquerda de (quase sempre) se opor a programas de criação de colégios e escolas militares ou da passagem da gestão de escolas (com graves problemas de disciplina e criminalidade) para mãos militares, não muda o grande erro deste governo e de seus apoiadores de escolherem os Institutos Federais (e por conseguinte o legado de Paulo Freire) como grandes inimigos. Trabalham contra a própria Educação que dizem defender; c) outro assunto, que deve ser muito interessante - mas para o qual admito não ter o mínimo acúmulo - seria o de analisar os próprios testes internacionais minuciosamente, e - sem negar sua validade e qualidades - questionar suas limitações.

NOTÍCIAS DE DIVERSAS FONTES CONTENDO OS RESULTADOS DOS INSTITUTOS FEDERAIS E COLÉGIOS MILITARES NAS AVALIAÇÕES INTERNACIONAIS

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APRESENTAÇÃO REALIZADA NA SEMANA PEDAGÓGICA DO CAMPUS CAMPO LARGO

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